Havendo quem se possa identificar com a questão que foi uma das minhas recentes fontes de reflexão, optei por trazê-la a este espaço de partilha.

Não é propriamente “novidade” pois já a terei abordado….

Mas a verdade é que vai sendo uma “visita regular” no meu pensamento e, talvez, porque mesmo antes de me ter confrontado com princípios fundamentais de ética e de conduta como os que constam do Estatuto da Ordem dos Advogados (Lei n.º 145/2015, de 9 de setembro), desde cedo no meu percurso profissional me fui regendo por alguns princípios que se tornam uma bússola que, a mim, sempre me “guia na direção certa” .

Em parte, porque arriscaria dizer que, “para o bem ou para o mal”, fazem parte do meu ADN.

Mas, também, porque tive uma grande escola como primeira experiência profissional (muito impactante no melhor dos sentidos e, sem dúvida, o “molde certo” para quem estava a iniciar a sua formação enquanto profissional).

E alguns deles resultaram, natural e espontaneamente, do facto de ter optado por uma vertente profissional em que o conhecimento e a tecnicidade estão bem presentes como “atores principais e necessários” para um cabal desempenho da(s) minha(s) função(ões).

Mas a que me refiro? Talvez facilite socorrer-me, precisamente, de alguns dos princípios do Estatuto da Ordem dos Advogados – os que “ressoaram em mim” de forma muito particular, quando me confrontei com a necessidade – e oportunidade – de os “estudar e testar”:

Artigo 81.º

Princípios gerais

1 – O advogado exercita a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável.

Artigo 88.º

Integridade

2 – A honestidade, probidade, retidão, lealdade, cortesia e sinceridade são obrigações profissionais.

Artigo 89.º

Independência

O advogado, no exercício da profissão, mantém sempre em quaisquer circunstâncias a sua independência, devendo agir livre de qualquer pressão, especialmente a que resulte dos seus próprios interesses ou de influências exteriores, abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional no intuito de agradar ao seu cliente, aos colegas, ao tribunal ou a terceiros.

Artigo 100.º

Outros deveres

1 – Nas relações com o cliente, são ainda deveres do advogado: b) Estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando para o efeito todos os recursos da sua experiência, saber e atividade; 

São princípios que considero basilares para um adequado e eficaz desempenho profissional, seja no contexto de uma organização e perante uma entidade patronal”, seja em “prática individual”.

E “universais” no sentido de que têm, pelo menos para mim, o mesmo sentido de existência e de aplicação prática e necessária se, nos exemplos acima referidos, substituirmos a palavra “advogado” por “profissional de trade/customs compliance” ou, até e também, por “consultor/assessor”.

A diferença é que no exercício da profissão de “advogado” – assim como de outras profissões reguladas, como seja a atividade de Despachante Oficial – existem regulamentos e códigos de deontologia que definem o tronco comum dos princípios e valores indispensáveis para um cabal desempenho da profissão.

E, referindo-me em concreto ao desempenho de funções como as de áreas técnicas como a de customs, trade compliance, tributária, no contexto de organizações nas quais essas áreas podem até ser designadas como “áreas de suporte” do negócio/atividade que constitui o “objeto social” da organização,

Podem suscitar-se desafios particulares se os profissionais que integram essas áreas – e os seus líderes – não tiverem bem presentes quais os princípios, valores e código de conduta que devem prevalecer.

Isto porque, e de forma muito natural (e sem qualquer intenção consciente para que assim seja), as “fronteiras” entre o que “deve ser” e o que “pode ser”/“mas afinal, todos fazem assim”, podem ser regularmente “testadas” no seu sentido e razão de ser,

Tanto mais, quanto menor seja a segurança e conhecimentos detidos por quem possa ter que:

  • Ser o “portador das notícias menos boas”,
  • Insistir na necessidade de se planear melhor e com tempo para que análises, não raras vezes, complexas, assim como as consequentes ações de implementação possam ser asseguradas,
  • Informar que “nem todas as áreas envolvidas ou necessário envolver” estarão a “fazer a sua parte” para que se possa garantir “compliance e eficiência”, e identificar ações e contributos necessários por parte de “terceiros” que possam implicar acréscimo de trabalho.

Há uma expressão que ouvia, não raras vezes, no meu contexto profissional anterior: a do “perigo que existe em se confundir a mensagem com o mensageiro”. E a mesma “encaixa que nem uma luva” no que são as mensagens que áreas técnicas, designadamente que se encontrem dentro de organizações como “áreas de suporte”, inevitavelmente acabam por ser chamadas a entregar à organização.

Uma vez mais como uma reação natural e, sob determinada perspetiva, até “legítima”, dos “terceiros” dentro da organização (outras áreas) que sejam os destinatários das “notícias menos boas” (v.g., o contrato apresenta riscos e responsabilidades aduaneiras que a empresa não está em condições de assumir; o desembaraço aduaneiro não pode ser assegurado de imediato, pois falta documentação/informação crítica;…), ou das ações que, a montante e dos “terceiros”, sejam necessárias e que impliquem “novos processos e/ou procedimentos”.

E refiro-me a reação “legítima” no sentido de que, em geral, não há quem não queira fazer “como deve ser” e/ou “da forma mais eficiente possível”.

Mas quando tal não é compatível com os recursos e meios disponíveis, ou com os demais objetivos e “KPIs” definidos, a margem e “espaço” para “aceitar e implementar” ou “aceitar e quantificar e assumir riscos ou perdas de eficiência” naturalmente reduz-se e, de modo muito particular nesses contextos, acabam por ser testados os princípios, valores e códigos de conduta ética dos profissionais “detentores do conhecimento técnico”.

A “boa notícia” é a de que começam já a não ser “raras” as organizações que, conscientes da importância e criticidade para salvaguarda de fatores chave como competividade, margem e reputação, definem os “princípios, normas e valores basilares” que devem nortear a organização e as áreas “técnicas” como trade compliance, aduaneira, tributária.

O que constitui, indubitavelmente, um “reforço critico” para o que possam ser já os princípios, valores e ética dos profissionais dessas áreas, designadamente porque, em situações de “dúvida” quanto às variáveis chave a contemplar nas “equações” das tomadas de decisão, há um “Estatuto Interno” que pode ser invocado e com base no qual se poderá tornar mais fácil de explicar que, no fim de contas, todos estão empenhados em garantir o “sucesso do negócio”, cada um:

Exercitando a defesa dos direitos e interesses que lhe sejam confiados sempre com plena autonomia técnica e de forma isenta, independente e responsável,

 “Agindo livre de qualquer pressão, especialmente a que resulte dos seus próprios interesses ou de influências exteriores, abstendo-se de negligenciar a deontologia profissional no intuito de agradar ao seu cliente, aos colegas, ou a terceiros”

 “Estudando com cuidado e tratando com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando para o efeito todos os recursos da sua experiência, saber e atividade”….

 

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