Depois de uma brevíssima pausa para (re)carregar baterias, gostaria de partilhar uma reflexão que dá continuidade a outras anteriores.

A abrangência da área aduaneira é grande e complexa, creio que este será já um ponto assente e sobre o qual não restarão grandes dúvidas.

O que coloca diversos desafios, desde logo aos operadores económicos que realizem operações que envolvam:

  • Fluxos de bens com origem fora da União Europeia (“UE”) e que impliquem a respetiva introdução nesse território aduaneiro e fiscal e/ou,
  • Fluxos de bens com origem na UE ou com estatuto comunitário que impliquem o respetivo transporte para fora da UE.

O primeiro dos quais sendo o de como garantir a “função aduaneira” necessária para garantir esses fluxos, seja numa vertente mais estratégica e de governance, seja na vertente mais operacional:

  • Se internamente (e nesse cenário, tendo que garantir  uma correta determinação dos recursos necessários, incluindo a definição dos perfis mais adequados),
  • Se em modelo de outsourcing e, nesse caso, que modelo (o que delegar em terceiros, em que terceiros delegar, como delegar, como monitorizar,….).

Outro desafio é o de estabelecer os limites e fronteiras do que faz sentido ser ou não âmbito da função aduaneira, designadamente quando estamos perante “impostos especiais”, como sejam os impostos especiais de consumo:

  • Em Portugal, os seguintes:

– Imposto sobre o álcool, as bebidas alcoólicas e as bebidas adicionadas de açúcar ou outros edulcorantes (IABA)

– Imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP)

– Imposto sobre o tabaco (IT).

  • Mas podendo existir outros, como seja o que Espanha estabeleceu, e em vigor desde janeiro 2023: o imposto sobre as embalagens de plástico não reutilizáveis (0,45€/kg de plástico que se fabrique ou se introduza no território fiscal espanhol com origem noutros Estados-Membros da UE ou em países terceiros).

Diria que os operadores económicos podem ser “convidados” particularmente a parar, pensar, avaliar, no caso de “novos” impostos como este que Espanha passou a prever para as embalagens de plástico não reutilizáveis – medida de cariz ambiental, decorrente de legislação europeia.

Por ser algo “novo” e que, não existindo “desde sempre”, no mínimo suscitará a necessidade de o operador económico parar para pensar “que novas obrigações vão ter que ser acauteladas, como e por quem”.

E, nesta fase, entramos no “terreno fértil” – ou, pelo menos, com potencial – para a reflexão a respeito de qual a área mais habilitada para assumir a responsabilidade e liderança da “nova obrigação”, sem prejuízo do (quase sempre) necessário envolvimento de outras funções no contexto do operador económico.

A este respeito poderá valer a pena considerar, entre outras variáveis relevantes para as decisões a tomar, que:

  • Os impostos especiais, assim como o IVA, apesar de serem “aplicados e cobrados” pelas alfândegas – por serem as autoridades que controlam (e autorizam) a introdução física de bens abrangidos pelo âmbito objetivo de sujeição aos mesmos e que estejam a ser “importados” (introduzidos no consumo, para além de em livre prática) – não têm por base legislação “aduaneira”;
  • Conhecer e saber aplicar a legislação na base dos mesmos pressupõe conhecimentos adicionais e específicos para além dos aduaneiros, mesmo se, como no caso dos impostos especiais de consumo, sejam definidos tendo como base uma “variável” de base aduaneira que são os códigos pautais (ou seja, pressupõem uma correta classificação pautal dos bens para que se assegure a determinação sobre se abrangidos ou não pelo âmbito de incidência objetivo do imposto e, se abrangidos, para uma correta determinação da taxa de imposto aplicável);
  • Sendo impostos que não têm como âmbito de incidência “exclusivo” a introdução física no território fiscal da UE bens expedidos a partir de países terceiros, já que aplicáveis, também, a movimentos físicos de bens entre Estados Membros, têm na sua génese uma “lógica de aplicação e incidência territorial” e implícitas consequências ao nível das “regras de sujeição, elegibilidade,….” que apresentam particularidades face à vertente da tributação aduaneira.

Assim, e quanto aos impostos especiais de consumo, a minha visão pessoal é a de que, no mínimo, é questionável se, no contexto de um operador económico que disponha de uma função fiscal e uma aduaneira, não fará sentido que os mesmos sejam enquadráveis no âmbito de responsabilidade da primeira (fiscal), mesmo se com a participação da função aduaneira (por exemplo, no suporte a ações necessárias como a de classificação pautal).

Pensando no caso concreto do imposto sobre as embalagens de plástico não reutilizáveis, sendo um imposto de cariz ambiental, poderá ainda ser de equacionar o cenário em que, dispondo o operador económico de uma área com responsabilidade sobre questões de “Qualidade/Ambiente”, possa essa área assumir uma corresponsabilidade – a par da área fiscal, ainda que contando com a participação da área aduaneira, por exemplo, na definição dos procedimentos conexos com a importação.

A conclusão final, depois de uma avaliação informada e consciente, poderá até ser a de que, em função de razões e necessidades concretas identificadas pelo operador económico, deva ser a área aduaneira a assumir, também e adicionalmente, a responsabilidade sobre temas que, na sua génese, pressuponham conhecimentos adicionais para além dos aduaneiros.

Mas é diferente chegar a essa conclusão equacionando alternativas que pudessem, ainda assim, fazer mais sentido, do que não chegar a ponderar outras alternativas.

Isto porque, no caminho da ponderação, sempre se contemplarão as inevitáveis especificidades e necessidades, desde logo de formação, de ferramentas específicas e, dependendo do perfil de recursos da função aduaneira, até de recrutamento de perfis que se possam adequar mais à gestão de temas cuja natureza vá além da “aduaneira”.

E, bem a propósito, importará começar a pensar nos impactos e implicações que decorrerão da futura entrada em vigor do mecanismo CBAM (Carbon Border Adjustment Mechanism)…

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