Para hoje uma reflexão sobre algumas questões que se podem colocar aos operadores económicos quando pensem, de forma consciente e informada, como pretendem definir as ações de preparação e submissão de declarações aduaneiras.

Até aqui antecipo que muitos possam estar já a pensar: mas não é só obter o contacto de um despachante oficial ou, até, contratar um “tudo incluído” ao operador logístico que esteja a ser contratado para assegurar o transporte internacional?

Poderá ser, sim, quando não se dedique algum tempo a pensar no tema…

Mas não será assim quando o operador económico saiba que:

  • Cada declaração aduaneira representa responsabilidades aduaneiras por si assumidas, mesmo se “representado por terceiros” na ação de preparação e submissão perante as autoridades aduaneiras
  • Que, na modalidade de representação aduaneira que possa ser comum – a direta,

Esse terceiro atuará em “nome e representação” do operador económico, ou seja, “como se fosse” o operador económico, porque mandatado por este e, não raras vezes, de forma inconsciente se alguém se limita a assinar um documento adicional solicitado já com os bens “parados numa alfândega” e, assim, muito urgente.

Neste contexto arriscaria até dizer que, eventualmente, sem que o documento acabe por ser válido atenta implícita função de atribuição de poderes de representação pelo operador económico a um terceiro, e poder estar a ser assinado por quem não esteja habilitado para conferir poderes de representação a terceiros (não bastará ser procurador da empresa…).

  • Que há, normalmente, três variáveis mínimas a considerar no desenho da função declarativa aduaneira: celeridade no desembaraço aduaneiro, preço e, não menos importante, garantia de compliance e de mitigação de riscos por um lado, e de ineficiências aduaneiras por outro.

Diria ser razoavelmente seguro admitir que as duas primeiras (celeridade e preço) são (as) normalmente consideradas.

Mas a questão do compliance nem sempre será devidamente pensada e contemplada pelo operador económico.

E é sobre esta que hoje me pretendo sumariamente debruçar.

No contexto em que o operador económico tenha esta componente bem definida como “igualmente importante” ou, até com maior peso relativo do que as anteriores,

Porque com impactos potencialmente significativos e graves como sejam riscos e contingências aduaneiras com impacto na “margem” em resultado de custos acrescidos resultantes de liquidações adicionais das autoridades aduaneiras,

Assim como riscos reputacionais e implícita redução do nível de fiabilidade perante essas autoridades mas, também, perante o “mercado”. E, em situações gravosas, podendo até colocar em causa a própria viabilidade do negócio,

Há, desde logo, uma questão que importa começar por responder:

A de qual o papel e âmbito de intervenção de um terceiro no papel de “declarante” que se pretende garantir, numa clara, concreta e consciente definição de “papéis e responsabilidades”:

  • Do operador económico por um lado,
  • E do terceiro em quem se deleguem as ações necessárias para o desembaraço aduaneiro dos bens (preenchimento e submissão das declarações aduaneiras e consequentes interações necessárias com as autoridades aduaneiras até “autorização de saída dos bens”).

Poderia ainda haver uma questão prévia relevante: a de uma avaliação da opção de internalização no operador económico dessas ações. Mas aqui já estaríamos num outro “campeonato” quanto às competências e recursos necessários deter pelo operador económico para que possa assegurar diretamente a preparação e submissão das suas declarações aduaneiras.

E bastaria a questão inicial acima partilhada para, “das duas uma”:

  • O operador económico dar-se conta de que não sabe muito bem o que responder e, neste cenário, concluir que talvez se justifique recorrer a quem o possa ajudar a definir um “caderno de encargos” adequado ao seu contexto e necessidades para uma consequente consulta ao mercado;
  • O operador económico até tem as respostas bem presentes e definidas e refletidas num caderno de encargos (na fase de consulta ao mercado) e está já a pensar em “patamares acima” para desenho consequente do contrato e respetivo “standard operating procedures” (sim, faz também sentido para a contratação do serviço de despacho aduaneiro!) como sejam:

– Como vai comunicar com o terceiro declarante podendo até ponderar o recurso a ferramentas que, mais ou menos sofisticadas, possam funcionar como worflow garantindo visibilidade, comunicação imediata e funcionando como repositório de informação;

– Se vai querer definir “instruções” a partilhar com o terceiro declarante para cada declaração aduaneira, ou seja, de que forma pretende garantir (co)participação no contexto em que reconhece que há responsabilidades que vai assumir com a submissão das declarações aduaneiras e, assim, que faz sentido que tenha também “uma palavra a dizer”;

– Quais os indicadores de nível e qualidade de serviço que fará sentido definir para monitorizar o serviço do terceiro declarante e que, se bem definidos, poderão ser úteis também para identificar eventuais lacunas próprias e/ou oportunidades de melhoria na esfera do operador económico.

Mas há, ainda, patamares adicionais possíveis como sejam o de,

No contexto em que, por hipótese, a modalidade de representação possível de garantir na contratação de um terceiro declarante seja a da “representação direta”,

O operador económico querer garantir que controla “100%” do que o declarante vai declarar em seu nome e representação e, assim,

Até ponderar mecanismos e ferramentas que permitam partilhar com esse terceiro já todos os dados necessários para preenchimento da declaração aduaneira, e num formato que permita ao declarante “carregar num botão” e carregar, quase que automaticamente, esses dados para o seu sistema e consequente comunicação às autoridades aduaneiras.

Admito que, com relação a esta última hipótese, não consegui ainda chegar a uma conclusão que reúna “consenso comigo própria” quanto ao sentido que possa fazer.

Isto porque ainda tendem a pesar mais, para mim, os argumentos de que:

  • Um operador económico que opte por esta alternativa estará a assumir 100% da responsabilidade do que virá a ser declarado perante as autoridades aduaneiras.
  • Limitando até as responsabilidades assumidas pelo terceiro declarante que acaba por reconduzir mais a um papel “administrativo” em que o “serviço contratado” acaba por ser mais o de “disponibilização de um sistema de preenchimento e comunicação com as autoridades aduaneiras”.
  • A este respeito, diria até provocatoriamente que, no limite, nem seria necessário um “despachante oficial” para assegurar essa tarefa,

E que, em teoria pelo menos, será até uma opção “tentadora” para os operadores logísticos que, com recurso a equipas  administrativas e sistemas poderão, assim, internalizar a etapa de desembaraço aduaneiro, garantindo o controlo total do fluxo internacional de bens para de forma mais eficaz poder garantir celeridade na entrega.

  • Tendo implícito que o operador económico deverá dispor dos meios, recursos, conhecimentos e perfis internos que permitam garantir um domínio total da legislação aduaneira e uma adequada capacidade de aplicação às operações concretas,

Assim como – e não menos crítico e relevante – a garantia de fiabilidade, conformidade, completude e atualidade da a informação que se encontre cadastrada nos sistemas do operador económico e/ou do que seja recebido e “digitalizado/processado” na documentação de terceiros.

No passado tinha-me já confrontado com um operador logístico a propor como solução inovadora para uma rápida tramitação aduaneira, a disponibilização de documentação em formato EDI que seria automaticamente lido pelo sistema e enviado para as autoridades aduaneiras.

Esta solução apresentada a quem só tenha presentes como “críticas e necessárias” as variáveis de “celeridade e preço” na contratação de serviço de despacho aduaneiro será, potencialmente, “música para os ouvidos”.

Mas quando trazida para o debate e reflexão a variável do compliance, não deve deixar, no mínimo, de fazer parar para pensar se, de facto, faz sentido ao operador económico:

  • Assumir, nesse contexto, toda a responsabilidade pela informação que será declarada (e que incluirá, por exemplo, o código pautal, informação de origem preferencial, valor aduaneiro) e,
  • Aceitar a implícita redução – ou até eliminação – da intervenção do terceiro declarante numa (co)validação e/ou determinação dos dados e implícita responsabilização pelo que é declarado perante as autoridades aduaneiras…

Eu, pessoalmente, ainda continuo a conseguir ver mais facilmente os riscos de soluções “automatizadas” de preenchimento das declarações aduaneiras, designadamente no contexto em que seja ainda incipiente o conhecimento e competências aduaneiras detidas pelos operadores económicos.

Haverá sempre que ponderar custo (riscos implícitos) em confronto com o benefício e não fazer apenas contas ao que se vai poder poupar de custo na preparação de cada declaração aduaneira…Até porque o que se poupa potencialmente na redução do custo de preparação das declarações aduaneiras deverá ser ponderado com a necessária estrutura de meios e de recursos materias e humanos que passa o operador económico a ter que dispor.

 

 

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