Debruço-me novamente (ainda que numa vertente distinta da já anteriormente abordada) sobre a questão e reflexão a respeito dos limites e fronteiras do que é (ou deveria ser) âmbito do direito aduaneiro e sua aplicação prática.

Isto porque a experiência – tanto em Portugal como em Espanha – me tem revelado que pode haver a “tentação” de “colocar tudo num mesmo saco” com o risco de, não sendo o “seu tratado pelo seu dono”, não serem os temas devidamente processados, explicados, tratados e acautelados.

E a que me refiro em concreto? À “confusão” que advém do facto de:

  • Para bens adquiridos a fornecedores estabelecidos fora da União Europeia, o primeiro ponto de controlo na entrada dos mesmos nesse território é a alfândega do Estado-Membro onde os mesmos são declarados para “introdução em livre prática e no consumo”, ou seja, é a autoridade aduaneira desse país que,
  • Para além dos controlos que asseguram no âmbito do que é definido pela legislação aduaneira (desde logo para garantir uma correta identificação e declaração dos bens, incluindo no respetivo valor aduaneiro, origem e código pautal aplicável),
  • Poderão assegurar também a validação sobre se “cumpridos os requisitos” definidos por legislação da União Europeia e, nalguns casos, legislação nacional, como “condição de autorização de entrada e comercialização no território europeu, como sejam, e a título ilustrativo, requisitos de segurança do consumidor (Diretiva RoHS) ou a questões ambientais conexas com o controlo e gestão de resíduos (Diretiva relativa aos resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos),
  • Nesse casos, “seguindo o guião” do que as autoridades nacionais competentes e com âmbito de responsabilidade, intervenção e controlo relativo a esses requisitos (como sejam, em Portugal a Agência Portuguesa do Ambiente, ou a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica; e em Espanha a Asociación de Inspectores SOIVRE), definem como “requisitos e documentos a validar/recolher” antes de ser autorizada a “introdução no consumo”,
  • Com a ressalva de que poderão até não ser as alfândegas a assegurar esses controlos, mas a agir de forma concertada com essas autoridades para que, sem a validação prévia das mesmas de que “cumpridas as condições” não seja “aceite nem processada” a declaração aduaneira de entrada dos bens no território aduaneiro e fiscal da UE.
  • E tudo porque há uma “fronteira” que assegura uma “barreira” à entrada no território europeu e se consubstancia num primeiro ponto de controlo, necessariamente pelas autoridades aduaneiras, dos bens expedidos de países ou territórios terceiros como consequência da obrigação prevista na legislação aduaneira de apresentação dos mesmos a essas autoridades.

Daqui resulta, não raras vezes, que,

  • O que são, na sua génese, requisitos de “produto” a acautelar pelos operadores económicos nos seus processos de sourcing e condições de compra a cumprir pelos fornecedores/produtores estabelecidos em países terceiros,
  • Sejam apresentados como requisitos aduaneiros…

Simplesmente porque,

  • Se não já identificados pelo operador económico e, até (como deveria ser, num “mundo ideal”) sinalizados e documentados (no que a respetiva legislação defina como “requisitos de prova”, como sejam “relatórios de conformidade”, marcações CE) ao despachante,
  • É este quem os identifica como “necessários cumprir e evidenciar” ao cliente (importador) e, até,
  • Nos casos em que, ou o cliente os desconheça (o que não deveria acontecer…), ou haja um “lapso de comunicação e identificação” daquilo a que o despachante se refere (como seja: porque se refere aos “códigos a declarar na casa 44 da declaração aduaneira” ou porque está a comunicar com uma área logística que não tem claros os limites e fronteiras do que é “aduaneiro”),

Tenta explicar os requisitos a cumprir mesmo não sendo (nem tendo que ser) especialista numa matéria que vai além do seu âmbito estrito de competência e conhecimento.

E quantas vezes não se desenrola um “pingue pongue” de emails ou telefonemas numa espécie de “tentativa e erro” – “será este o relatório”, “veja lá se este documento serve” – até que finalmente se possa acertar no documento e se “despache” o desembaraço aduaneiro de bens urgentes, ficando a pairar nas mentes de várias das pessoas e áreas envolvidas que “a alfândega não para de complicar”…

Quando, na prática, estão em causa requisitos que:

  1. Devem ser conhecidos, desde logo, por quem negoceia os bens aos quais os mesmos sejam aplicáveis, com fornecedores estabelecidos em países terceiros, pois são “condição” para que a conclusão da compra faça sentido.

De outra forma, de que serve comprar algo que não cumpre com os requisitos de autorização de entrada e comercialização no território europeu e que, por isso, ou vai ter que ser devolvido a procedência ou destruído?

  1. São um âmbito de intervenção “normal” de áreas como a de Qualidade que trabalha (ou deve trabalhar) normalmente em colaboração com as áreas comerciais na identificação dos requisitos a cumprir e na documentação e, também, na validação dos mesmos em associação a cada processo de compra.
  1. Devem fazer parte do “dossier de dados de produto” e, assim, encontrarem-se desde logo validados e disponíveis por quem os domine, sem que nem a área aduaneira (se internalizada no operador económico), nem o despachante, tenham que “ir ler diretivas, legislação nacional” para as quais as normais “ICs” (Informações Complementares) remetem e/ou contactar as autoridades nacionais competentes identificadas nas referidas ICs, num esforço de explicar ao cliente o que este, correndo bem, já deveria conhecer…

Creio que a confusão se gera e perpetua se a área do operador económico que recebe o pedido do despachante de “disponibilização do certificado de conformidade”, do “contrato EcoPilhas” não tiver já bem claro a que área, dentro da organização, deve aquela informação ser solicitada.

Assim como se não tiver também claro que não faz sentido assumir como “normal” ser surpreendido por um pedido do despachante que deveria ter sido já antecipado, informado e documentado e iniciar, já com os bens “parados na alfândega” a “corrida” de verificação sobre se o mesmo está ou não cumprido,

Mas sim ter claros todos os requisitos que serão verificados ou verificáeis no momento da declaração de “importação” – aduaneiros ou não aduaneiros, 

E ser a respetiva documentação desde logo disponibilizada com a demais normal e standard (fatura + packing list) sem que tenha que ser solicitada pelo despachante (se, ainda assim, correr bem e este a solicitar em momento prévio ao da submissão da declaração aduaneira) ou já pela alfândega porque realizou um controlo documental ou documental e físico e a tenha (inevitavelmente solicitado.

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